Skip to main content

A Monetização dos Prejuízos Ocorridos nos Sinistros Rodoviários no Transporte Rodoviário de Cargas – Novas Perspectivas

Transporte rodoviário no Brasil tem uma importância vital para a economia nacional. De dimensões continentais, o país é ainda totalmente dependente deste modal; com isso, os episódios que interrompem a normalidade deste fluxo, tais como os eventos criminosos (roubo, furto, fraudes, etc.) e também aqueles derivados dos acidentes de trânsito, denotam que empreender na atividade de veículos de carga rodoviários (seja de pessoas ou bens) é algo desafiador, haja vista tantas variáveis.

E os valores envolvidos nestes prejuízos registram números significativos, tanto na perda das mercadorias e veículos ou mesmo nas despesas de contingência rodoviária, manutenções e reparos não programados, elevações dos custos securitários, interrupção do ciclo produtivo, etc. Apenas como estatística, registramos mais de 170 mil acidentes de trânsito por ano, somente nas rodovias federais; ao orçamento público, estes eventos custam em média R$ 72,7 mil ao país. E não é só o impacto financeiro: no ano de 2014, cerca de 20 pessoas morreram por dia em rodovias federais, por conta de acidentes; o custo total com mortos, feridos e danos materiais foram estimados em valores superiores a R$ 12 bilhões. Certamente, a cifra chega a R$ 40 bilhões, quando somados aos acidentes em rodovias estaduais e municipais, em termos de estatísticas conservadoras, a considerar as subnotificações que acompanham as atividades de transporte e eventual deficiência de atendimento por entidades públicas- que costumeiramente nos atendem muito mal, registre-se.

Com isso tudo, o empresário do transporte deveria, em tese, preocupar-se suficientemente com estes números assombrosos. Mas, como regra geral, o transportador, principalmente os de pequeno e médio porte, trabalha com a ideia fixa de que eventos desta natureza são quase uma ‘fatalidade matemática’ ou 'nunca vai acontecer comigo'. Mesmo contando com coberturas securitárias (apólices de seguros e outras estratégias), em grande maioria mal dimensionadas para as atividades de transporte que seus veículos exercem ou existindo apenas para atender obrigatoriedades contratuais. Geralmente, o transportador não exerce uma gestão plena e preditiva do risco rodoviário, sempre confiando na contratação do método tradicional de gerenciamento de riscos de cargas (por obrigação securitária); por fim, acha que está ‘a salvo’ de todos os eventos (e respectivos riscos), com conhecimento muito superficial dos clausulados (normas estipuladas pelo seguro) e demais condições- inclusive, ignorando as regras que desobriga a indenização por causalidade interna (de responsabilidade do transportador, seu motorista ou qualquer um sob sua subordinação).

Como um case para a comprovação desta tese, devemos analisar a ocorrência de um hipotético sinistro rodoviário com perda da carga transportada, que ocorreu com certo transportador. Para ‘fins didáticos’, não é relevante que seja especificamente um roubo, furto, acidente ou incidente rodoviário. Neste raciocínio, após o atendimento da ocorrência e demais tratativas de investigação (seja por análise securitária ou mesmo providenciada pelo embarcador ou contratante do serviço de transporte), fica determinado que o fato ocorreu por RESPONSABILIDADE EXTERNA, isto é, que a causa principal do sinistro (indicada com evidências ou indícios suficientes em relatório especializado), não surgiu derivada das ações do condutor ou transportador (proprietário ou agregador) ou mesmo vieram a facilitar a ocorrência do fato gerador do prejuízo. No caso, pode-se dizer que o empresário transportador está isento de responsabilidades sobre o evento, considerando também que não houve violação do Plano de Gerenciamento de Riscos (em caso de fatos criminosos), além de ser observadas as paradas necessárias de descanso e cumprimento integral a legislação específica de descanso. Por fim, o veículo transportador não apresentou problemas de manutenção, incorreto estivamento ou deficiência nas ferramentas (tecnologias e itens mecânicos) de controle de acesso à carga. Com isso, deve-se tratar o evento como um ‘item histórico’, sendo exaustivamente discutido e evidenciado para os demais players da operação como uma ‘lição aprendida’, com o desiderato de evitar as oportunidades que o evento volte a ocorrer.

Por outro lado, se neste caso hipotético a apuração pós-evento comprovar que alguma das atividades internas esperadas e previstas não foram cumpridas (manutenção, regras de gerenciamento e cumprimento de demais normas, etc.), poderá ser indicada a RESPONSABILIDADE INTERNA, isto é, que o fato ocorreu por algum tipo de desídia, desatenção ou culpa do transportador, ato ou falta de ação de seu motorista ou pessoa do processo logístico ou de transporte. Neste exemplo, geralmente o embarcador (e, possivelmente, o segurador) poderão tomar ‘ações de exceção’, tais como a negativa do ressarcimento ou a cobrança direta dos prejuízos apurados.

Chega-se ao ponto importante- principalmente para o embarcador, ao interpretar como único prejuízo a perda da mercadoria (valor de saída da fábrica) e que seu valor econômico deverá ser reposto, fato que é uma interpretação comum. Fica a indagação: e a falta do produto esperado pelo cliente? E, para casos de produtos de varejo, o quanto isto pode impactar na relação comercial entre o fabricante e um lojista? Considerando que, notadamente no varejo alimentício, as posições nas gôndolas e pontos de venda são cotadas abertamente no mercado (entre o lojista e seus fornecedores), incluindo aí uma ‘verba de introdução’ (custo para dispor produtos na melhor posição de venda), deve ser ignorada a monetização da falta dos itens nas posições de venda? O que essa quebra do fornecimento (geralmente, se trabalha muito com o ‘just-in-time’, nos dias atuais) pode impactar na exposição do branding (da marca e do produto), perante o consumidor final? Ao fim, com o atraso da chegada do produto ao expositor, o lojista costuma prontamente reposicionar marcas- seja para que não tenha uma posição de venda com espaços vazios, ou mesmo para que possa negociar com outros fornecedores de produto semelhante (a já esclarecida ‘posição de venda’). Quanto ‘vale’ (valor e custo) esta mudança inesperada e indesejada, o quanto afeta o retail marketing?

Portanto, é necessário discutir os prejuízos diretos, indiretos e reflexos nos casos em que as mercadorias transportadas não são entregues em tempo hábil por responsabilidade do transportador, mediante culpabilidade interna em sinistros rodoviários (devidamente apuradas e evidenciadas), salvo condições estipuladas em outros termos contratuais. Com estas ações, espera-se um maior comprometimento dos transportadores e a correta precificação dos prejuízos ocorridos, dimensionando-os de forma holística em todo o processo logístico- incluindo aí, o custo do esperado planograma.


Gostou do conteúdo? Compartilhe!